quarta-feira, 5 de julho de 2017

O CASAMENTO DA RAPOSA

        Das histórias que meu avô me contou, uma em especial, ficou em minha memória, depois de muito tempo, resolvi escrever em cordel, de um jeito fiel ao que ele contava. 
Ditados populares sempre estão presentes nas nossas vidas, principalmente na infância. "Sol com chuva, casamento da raposa", é um desses ditados. De todas as histórias, eu gostava dessa em especial, pois de acordo com o personagem que falava, meu avô fazia várias vozes, distinguindo os animais que falavam na história. As fábulas fazem parte da nossa cultura, os ditados, das nossas infâncias.

Segue a história completa do "Sol Com Chuva, Casamento da Raposa" narrada em cordel por mim:



Em nossa infância querida,
Ouvimos muitas histórias
Que ficam presentes sempre
Na caixinha das memórias.
Assim vão se eternizando
As fábulas mais notórias.

A nossa imaginação
É mui fértil, sonhadora.
Acredita em muita história
De Trancoso, assustadora,
E sobre animais que falam
Numa era encantadora.

Das tantas belas histórias
Que meu avô me contou,
Há uma que se destaca,
E sobre a qual me falou:
– Eu vou contar a história
Da raposa que casou!

Numa floresta morava
Uma raposa bem esperta
Que vivia recostada
Sobre uma janela aberta
Procurando namorado,
Ficando sempre de alerta.

A solitária raposa
Espalhou pela floresta
Um boato de que ela
Faria uma grande festa
Para escolher um parceiro,
Espantando a dor funesta. 

Logo os animais da mata 
Começaram a espalhar
Que a solitária raposa
Procurava se casar,
E que uma grande festa
Ela pretendia dar.

Um raposão educado 
De porte fino e falante
Dos planos da tal raposa
Veio a saber num instante
E achou uma grande ideia
Apesar de intrigante.

À raposa, pelo rato,
Um bilhete então mandou.
Na cartinha, um encontro
Com a raposa marcou.
No encontro, ele fez juras,
E logo o casal noivou.

Sendo assim, anunciaram
A data do casamento.
Fizeram uma festança,
Sendo um concorrido evento.
De muito longe se ouvia
O festejo barulhento.

A festa foi muito grande,
Todos foram convidados.
Todo tipo de animal
Veio de todos os lados.
A floresta se enchia,
Estavam muito animados.

Cada animal convidado
Trouxe na mão um presente.
E cada um demonstrava
Estar bastante contente
Com o noivado bonito
Da raposa e seu parente.

Apenas um animal
Não trouxe presente algum.
Inda atentamente olhou
O que trouxe cada um.
Depois disse: – Meu presente
Não se compara a nenhum!

Esse animal curioso
Era o leão imponente,
O rei de todos os bichos
Muito altivo e eloquente.
Sendo rei, quis dar à noiva
Magnífico presente.

Logo subiu numa pedra,
E, para os bichos olhando,
Falou com sua voz altiva:
– Um presente venerando.
Eu ofertarei à noiva.
Algo então vou perguntando.

Perguntou então a ela
Sem fazer muito cerol:
– Eu quero saber, responda
Antes que venha o arrebol:
Você quer seu casamento
Num dia de chuva ou de sol?

– Eu sou o rei da floresta,
O majestoso leão.
Mas uma grande humildade
Vim à comemoração
Quero que sejam felizes,
Tendo paz no coração.

“Mas digo: se quiser sol, 
Casando em dia bonito,
Virá um bando de pássaros
Com seus bicos de apito
Para atrapalhar a festa,
Pondo todo mundo aflito.”

“Se o dia for de chuva,
Não terá festa animada.
Mas quem casa em dia assim
Tem alegria dobrada,
Sendo os noivos bem felizes
Por toda a sua jornada.”

A raposa, pensativa,
Demorou a responder.
O leão, impaciente,
Tornou então a dizer:
– Se decida, minha cara, 
Para o presente obter.

Sendo ladina, a raposa,
Temia se arrepender
Ante a referida escolha
Que deveria fazer.
Duvidando do leão,
Começou a responder:

– Acredito que o leão
Esse poder não detém
De manobrar sol e chuva,
Um poder que só Deus tem.
Mas... se tiver? Quero sol,
Mas quero a chuva também.

– Se o leão poderoso
Tiver mesmo esse poder,
É este o meu pedido
Que ele há de atender:
Sol e chuva no casório
Para ninguém se esquecer.

Quando o leão ouviu isso,
Com ela ficou irado:
– Duvidas de mim, raposa?
Com isso estou transtornado!
Como rei, o meu poder,
Saiba que é ilimitado!

“Por isso, há de ter sol
E chuva em seu casamento!
Ele será, minha cara,
Inesquecível evento.
Minha palavra não volta
Esse é meu juramento.”

Para o espanto de todos,
Naquele formoso dia,
Reinou sol e reinou chuva,
Foi a maior gritaria.
Então a raposa esperta
Foi tomada de alegria.

Daquele dia em diante,
Pra ninguém mais se esquecer
Da promessa do leão
E do seu grande poder,
Quando raposa se casa
No calor, há de chover.

Quando ouço alguém dizer
Sol com chuva é casamento
Da raposa na floresta,
Me lembro do juramento
Que o rei leão fez a ela
Cheio de convencimento.

Os mais velhos nos ensinam
Tantas e boas lições,
Tantas histórias bonitas
Passadas por gerações...
São, portanto, da cultura,
Verdadeiros guardiões.

E foi assim que se deu
O casamento bonito
Da raposa e o raposo,
Como vovô tinha dito.
Casando raposa, assim,
O dia fica esquisito.

Sol e chuva, diz o dito,
É raposa se casando.
Os mais velhos é quem contam,
A gente vai repassando.
Assim, a lenda perdura,
E vai se perpetuando.

Caro leitor, registrei
O que meu avô contou
Sobre o dito tão antigo
Que nosso povo guardou.
Espero ter agradado
Com o que aqui se narrou.

Raposa, quando se casa, 
A chuva se une ao sol.
Falam alguns que é quando,
Ao altar, sobe espanhol.
Eu repito que é raposa,
Leitor fiel e de escol.


FIM

4 comentários:

  1. Eu me lembro dessa história mainha costumava me contar 😀

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  2. Minha mãe me dizia sempre sobre o casamento da raposa!

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  3. Lindo texto e história recontada ao seu modo. Essa lenda é daquelas que ficam na mente para sempre. Sol e Chuva formam o Arco-Íris no Céu, coisa de Deus mesmo.

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  4. Diante de tão diletos versos e tanta elegância,
    Logo me fizeste lembrar de minha infância!

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